domingo, 30 de agosto de 2009

Curiosidades - Padre Cícero e Lampião

O sertanejo é uma figura muito significativa
na formação cultural do nosso país.
Ele representa um elemento conector entre os
costumes dos nossos indígenas e os hábitos
dos colonizadores, formando uma cultura
merecedora de um estudo mais acurado.
O sertanejo, além de ser antes de tudo um
forte, ele tem a sua formação apoiada no
misticismo, na supertição, na capacidade
de aceitar o sofrimento com resignação.
É, na aparência, dolente, tranqüilo, humilde,
mas quando ferida a sua suscetibilidade,
num lampejo, transforma-se em um ser ágil,
sua força e coragem se multiplicam; não admite
ser dominado e enfrenta tudo e a todos com
denodo e determinação, sem medir as conseqüências.

O sertanejo nordestino cultua duas figuras entre
si contemporâneas: O Padre Cícero Romão Batista,
O Padim Cisso como o seu norte místico e
Virgulino Ferreira da Silva. O Lampião , como
o seu herói, exemplo que o faz não permitir
que maculem os seus brios.

PADRE CÍCERO - Padre Cícero Romão Batista, foi,
além de sacerdote, condição que impunha respeito,
um poderoso chefe político, de muita influência,
nas primeiras décadas do século passado
(até 1934. quando veio a falecer).
O Padre Cícero nasceu na cidade do Crato (CE),
em 24 de março de 1.844 e faleceu aos 90 anos, em
Juazeiro do Norte, no dia 29 de julho de 1934.

Esse sacerdote e político, considerado pelos os
seus seguidores como um santo, implantou, com
os seus milagres, um reduto poderoso de fé e de
credulidade. Essa localidade é a atual progressista
cidade de Juazeiro do Norte, no cariri cearense,
centro de peregrinação de milhões de nordestinos
de vários estados que para lá convergem para
serem acorridos nas suas necessidades.

LAMPIÃO - Virgulino Ferreira da Silva conhecido
como Lampião, nasceu em 04 de junho de 1898,
no sertão de Pernambuco, no sítio Passagem das Pedras,
no município de Vila Bela, atualmente Serra Talhada,
e foi assassinado numa emboscada, feita pela policia,
na caatinga do município de Angicos, Estado de Sergipe,
em 20 de julho de 1934, portanto, aos 36 anos de idade.

Depois de ser um trabalhador honesto, um sertanejo
de bem, não encontrou outra alternativa senão
integrar-se ao cangaço, cansado de tanta perseguição
política e de presenciar e ser vítima da sanha dos
coronéis. Seu ingresso no cangaço iniciou-se para
vingar a morte de seu pai, José Ferreira, homem calmo
e reconhecidamente pacato. Dizem que enquanto o
pai aconselhava os filhos na sala a mãe, mulher
destemida, armava os filhos na cozinha.

Lampião, como os demais sertanejos, tinha na figura do
Padre Cícero, um santo milagroso e protetor,
a quem devia obediência, fato que o levou a visitá-lo.
Uma curiosidade: Lampião não atacava o Estado do Ceará,
em respeito ao Padre Cícero. Para não me alongar,
nada melhor do que uma entrevista do próprio Lampião,
concedida ao médico do Crato, Dr. Octacílio Macedo,
com modificações no linguajar, para se tornar mais
inteligível. Segue um trecho dessa entrevista:

Lampião começou por identificar-se:
- Chamo-me Virgulino Ferreira da Silva e pertenço à humilde
família Ferreira do Riacho de São Domingos, município
de Vila Bela. Meu pai, por ser constantemente perseguido
pela família Nogueira e em especial por Zé Saturnino,
nossos vizinhos, resolveu retirar-se para o município
de Águas Brancas, no estado de Alagoas.
Nem por isso cessou a perseguição.

- Em Águas Brancas, foi meu pai, José Ferreira, barbaramente
assassinado pelos Nogueira e Saturnino, no ano de 1917.

- Não confiando na ação da justiça pública, por que os
assassinos contavam com a escandalosa proteção dos grandes,
resolvi fazer justiça por minha conta própria, isto é,
vingar a morte do meu progenitor. Não perdi tempo e
resolutamente arrumei-me e enfrentei a luta.
Não escolhi gente das famílias inimigas para matar,
e efetivamente consegui dizimá-las consideravelmente.

Sobre os grupos a que pertenceu:

- Já pertenci ao grupo de Sinhô Pereira, a quem acompanhei
durante dois anos. Muito me afeiçoei a este meu chefe,
porque é um leal e valente batalhador, tanto que se
ele ainda voltasse ao cangaço iria ser seu soldado.

Sobre suas andanças e seus perseguidores:

- Tenho percorrido os sertões de Pernambuco,
Paraíba e Alagoas, e uma pequena parte do Ceará.
Com as polícias desses estados tenho entrado em
vários combates. A de Pernambuco é disciplinada
e valente, e muito cuidado me tem dado.
A da Paraíba, porém, é uma polícia covarde e insolente.
Atualmente existe um contingente da força
pernambucana de Nazaré que está praticando as maiores
violências, muito se parecendo com a força paraibana.

Referindo-se a seus coiteiros, Lampião esclareceu:

- Não tenho tido propriamente protetores.
A família Pereira, de Pajeú, é que tem me protegido,
mais ou menos. Todavia, conto por toda parte
com bons amigos, que me facilitam tudo e me consideram
eficazmente quando me acho muito perseguido pelos governos.

- Se não tivesse de procurar meios para a manutenção
dos meus companheiros, poderia ficar oculto
indefinidamente, sem nunca ser descoberto pelas
forças que me perseguem.

- De todos meus protetores, só um traiu-me miseravelmente.
Foi o coronel José Pereira Lima, chefe político de Princesa.
É um homem perverso, falso e desonesto, a quem durante
anos servi, prestando os mais vantajosos
favores de nossa profissão.

A respeito de como mantém o grupo:

- Consigo meios para manter meu grupo pedindo recursos
aos ricos e tomando à força aos usuários que
miseravelmente se negam de prestar-me auxílio.

Se estava rico:

- Tudo quanto tenho adquirido na minha vida de bandoleiro
mal tem chegado para as vultuosas despesas do meu
pessoal - aquisição de armas, convindo notar que
muito tenho gasto, também, com a distribuição de
esmolas aos necessitados.

A respeito do número de seus combates e de suas
vítimas disse:

- Não posso dizer ao certo o número de combates em que
já estive envolvido. Calculo, porém, que já tomei
parte em mais de duzentos. Também não posso informar
com segurança o número de vítimas que tombaram sob a
pontaria adestrada e certeira de meu rifle.
Entretanto, lembro-me perfeitamente que, além dos civis,
já matei três oficiais de polícia, sendo um de
Pernambuco e dois da Paraíba. Sargentos, cabos e
soldados, é impossível guardar na memória o número
dos que foram levados para o outro mundo.

Sobre as perseguições e fugas deixou claro:

- Tenho conseguido escapar à tremenda perseguição que me
movem os governos, brigando como louco e correndo
rápido como vento quando vejo que não posso resistir ao
ataque. Além disso, sou muito vigilante, e confio
sempre desconfiando, de modo que dificilmente me
pegarão de corpo aberto.

- Ainda é de notar que tenho bons amigos por toda parte,
e estou sempre avisado do movimento das forças.

- Tenho também excelente serviço de espionagem,
dispendioso mas utilíssimo.

Seu comportamento mereceu alguns comentários bastante francos:
- Tenho cometido violências e depredações vingando-me dos
que me perseguem e em represália a inimigos.
Costumo, porém, respeitar as famílias, por mais humildes
que sejam, e quando sucede algum do meu grupo
desrespeitar uma mulher, castigo severamente.

Perguntado se deseja deixar essa vida:
- Até agora não desejei, abandonar a vida das armas,
com a qual já me acostumei e sinto-me bem. Mesmo que
assim não sucedesse, não poderia deixá-la, porque
os inimigos não se esquecem de mim, e por isso eu
não posso e nem devo deixá-los tranqüilos.
Poderia retirar-me para um lugar longínquo, mas
julgo que seria uma covardia, e não quero
nunca passar por um covarde.

Sobre a classe da sua simpatia:
- Gosto geralmente de todas as classes. Aprecio de
preferência as classes conservadoras - agricultores,
fazendeiros, comerciantes, etc., por serem os homens
do trabalho. Tenho veneração e respeito pelos
padres, porque sou católico. Sou amigo dos
telegrafistas, porque alguns já me tem salvo de grandes
perigos. Acato os juizes, porque são homens da lei
e não atiram em ninguém.

- Só uma classe eu detesto: é a dos soldados, que são
meus constantes perseguidores. Reconheço que muitas
vezes eles me perseguem porque são sujeitos, e é
justamente por isso que ainda poupo alguns quando
os encontro fora da luta.

Perguntado sobre o cangaceiro mais valente do nordeste:
- A meu ver o cangaceiro mais valente do nordeste foi
Sinhô Pereira. Depois dele, Luiz Padre. Penso que
Antonio Silvino foi um covarde, porque se entregou
às forças do governo em consequência de um pequeno
ferimento. Já recebi ferimentos gravíssimos e nem
por isso me entreguei à prisão.

- Conheci muito José Inácio de Barros. Era um homem
de planos, e o maior protetor dos cangaceiros do
nordeste, em cujo convívio sentia-se feliz.

Questionado sobre ferimentos em combate, contou:
- Já recebi quatro ferimentos graves.
Dentre estes, um na cabeça, do qual só por um milagre
escapei. Os meus companheiros também, vários têm sido
feridos. Possuímos, porém, no grupo, pessoas
habilitadas para tratar dos ferimentos, de modo que
sempre somos convenientemente tratados. Por isso,
como o senhor vê, estou forte e perfeitamente sadio,
sofrendo, raramente, ligeiros ataques reumáticos.

Sobre ter numeroso grupo: - Desejava andar sempre
acompanhado de numeroso grupo. Se não o organizo
conforme o meu desejo é porque me faltam recursos
materiais para a compra de armamentos e para a
manutenção do grupo - roupa, alimentação, etc.
Estes que me acompanham é de quarenta e nove homens,
todos bem armados e municiados, e muito me custa
sustentá-los como sustento. O meu grupo nunca foi
muito reduzido, tem variado sempre de quinze a
cinquenta homens.

Sobre padre Cícero Lampião foi bem específico:
- Sempre respeitei e continuo a respeitar o estado
do Ceará, porque aqui não tenho inimigos, nunca me
fizeram mal, e além disso é o estado do padre Cícero.
Como deve saber, tenho a maior veneração por esse
santo sacerdote, porque é o protetor dos humildes e
infelizes, e sobretudo porque há muitos anos protege
minhas irmãs, que moram nesta cidade.
Tem sido para elas um verdadeiro pai.

Convém dizer que eu ainda não conhecia pessoalmente o
padre Cícero, pois esta é a primeira vez que venho
a Juazeiro.

Em relação ao combate aos revoltosos:
- Tive um combate com os revoltosos da coluna Prestes,
entre São Miguel e Alto de Areias. Informado de que
eles passavam por ali, e sendo eu um legalista,
fui atacá-los, havendo forte tiroteio. Depois de grande
luta, e estando com apenas dezoito companheiros,
vi-me forçado a recuar, deixando diversos inimigos feridos.

A respeito de sua vinda ao Ceará:
- Vim agora ao Cariri porque desejo prestar meus serviços
ao governo da nação. Tenho o intuito de incorporar-me
às forças patrióticas do Juazeiro, e com elas oferecer
combate aos rebeldes. Tenho observando que, geralmente,
as forças legalistas não têm planos estratégicos,
e daí os insucessos dos seus combates, que de nada
tem valido. Creio que se aceitassem meus serviços e
seguissem meus planos, muito poderíamos fazer.

Sobre o futuro Lampião mostrou-se incerto, apesar de ter planos:
- Estou me dando bem no cangaço, e não pretendo abandoná-lo.
Não sei se vou passar a vida toda nele. Preciso trabalhar
ainda uns três anos. Tenho de visitar alguns amigos,
o que não fiz por falta de oportunidade. Depois, talvez
me torne um comerciante.

Aqui termina a entrevista concedida por Lampião em Juazeiro.
Na despedida Lampião nos acompanhou até a porta.
Pediu nosso cartão de visita e acrescentou:

- Espero contar com os "votos" dos senhores em todo tempo!

- Que dúvida... respondemos.

(Entrevista extraída do SITE OFICIAL -
Mantido por Vera Ferreira, Neta de Lampião e Maria Bonita.
- www.infonet.com.br/lampiao/ )
Segundo informação, ao ser publicada a entrevista,
foi feita uma adaptação do linguajar,
para melhor compreensão.

TIREM AS SUAS PRÓPRIAS CONCLUSÕES.

Nenhum comentário:

Postar um comentário